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Quando indagado por um repórter português sobre a estranha aproximação com um grupo azovista neofascista de lá, Raphael Machado, líder da Nova Resistência, disse não se recordar de ter notado a escolha geopolítica do Escudo Identitário. Será mesmo? À seguir, uma análise do histórico de ambas partes.

CasaPound e Escudo Identitário com bandeiras dos respectivos grupos em evento em Portugal

Desde sua criação, em 2017, o Escudo Identitário é o braço mais conhecido do movimento nazifascista italiano CasaPound em Portugal. Não só pela publicidade em afirmar a inspiração, mas por trazerem o próprio grupo original ao país e replicar sua agenda ponto a ponto. A CasaPound foi a maior influência de vários personagens que fundaram a Nova Resistência brasileira, como explicado aqui e podemos ver neste vídeo:

Não por acaso a Nova Resistência foi um dos responsáveis, ao lado dos neointegralistas da Accale, por trazer ao Brasil a CasaPound. Também é importante recordar que outros movimentos ligados a CasaPound estavam na lista de assinaturas, junto a Nova Resistência, do manifesto da internacional neofascista de meados da década passada, como podemos ver aqui:

Artigo no site da Nova Resistência descreve o encontro com a CasaPound no Brasil, na platéia se vê a camisas do m8l8th, Burzum e Zentropa

Uma coisa que chama atenção nas imagens publicadas do evento, é a presença de símbolos ligados ao movimento neonazista ucraniano Batalhão Azov. As relações da CasaPound com o Batalhão Azov são bem conhecidas, em Kiev, o QG do batalhão se tornou uma ocupação da marca, com o nome de CasaCossaca.

A CasaPound deve ser lembrada não apenas pela criação de movimentos de moradia de caráter racista e sua guerrilha cultural pró-fascismo, mas também pelo uso da violência. Além dos diversos casos de linchamento de esquerdistas, antifascistas e grupos minoritários por parte de seus squadristi, é preciso lembrar principalmente do massacre perpretado por um dos seus membros contra ambulantes senegaleses em 2011, em Florença, e também da colaboração com agrupamentos militares como Karpatska Sich e Misanthropic Division.

Manifestação contra CasaPound a propósito do Massacre de Florença, na placa 'CasaPound esquadristas assassinos'

Ainda mais grave, a relação com este último grupo teve efeitos no Brasil. Uma matéria da GZH revelou que o italiano casapoundista Francesco Fontana esteve no país recrutando neonazistas daqui para a guerra na Ucrânia.

Mas como explicar a aparente contradição de duginistas apoiarem um grupo azovista? É claro que a agenda central de Dugin em relação à Ucrânia é prioritária, do ponto de vista da tomada de poder, mas o trabalho de doutrinação ideológica, de promover uma cultura reacionária e fascistizada, também o é.

Dugin não pode se dar ao luxo de romper totalmente com uma das mais importantes organizações da guerra cultural neofascistas, mesmo que evidencie a falsidade do seu discurso de que a “operação especial” seria para derrotar os neonazistas de Kiev. O discurso público não tem que coincidir com o privado, difundido apenas na grande rede da extrema direita internacional. O caos que promovem é para nós, reles mortais devorando propaganda na internet. Nos bastidores, reina a diplomacia com os colegas nazifascistas de diferentes variedades.

Notícia sobre o encontro de Dugin na Itália com a CasaPound

Na verdade, as lideranças intelectuais dos neonazistas ucranianos foram forjadas no seio do movimento de Dugin, exaltando o patriotismo de Stepan Bandera com a anuência do filósofo. E apesar de uma série de brigas intranacionalistas sobre o futuro da agenda do movimento levarem à ruptura em eurasianistas e pan-europeistas, muitos tentaram até o último momento conectar essas pontes.

No auge do colapso de Maidan, Olena Semenyaka, que foi braço direito do ideólogo russo e escreveu junto dele parte de sua teoria, continuava a celebrar o autor. Inclusive, nas ocupações dos nazistas durante o Maidan, encontrávamos aberrações como a infâme faixa do Lênin Fascista, levantada pelos colegas ucranianos de Semenyaka.

Fundamentalmente azovistas e duginistas discordam em reorganização geopolítica, onde será o centro do novo Império a restaurar os valores feudais do Ocidente, mas o cerne moral-filosófico permanece. Não é de se estranhar que o quadro de Julius Evola, figura central do pensamento de Dugin, figura ao centro da lojinha do batalhão Azov na CasaCossaca. Também não causa espanto casos bizarros brasileiros, como este aqui.

Sede da CasaCossaca com o quadro de Julius Evola

Manter algum nível de contato com todas as correntes da extrema direita é essencial para o projeto da internacional nazifascista avançar pontos de sua agenda. Não tenha dúvidas, eles mesmos se entregam:

Olena Semenyaka com a bandeira do Escudo Identitário

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