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Recentemente a ABIN revelou que a ação golpista violenta de Janeiro no Brasil foi uma trama que incluía neonazistas, fake news e produção de armas de fogo irregulares. Discuto aqui a história de um dos grupos, saindo do submundo e indo à política da superfície pós-bolsonarista.
Segundo relatório da ABIN, grupos neonazis organizados no Telegram se valiam de falsas acusações sobre a lisura das eleições para atrair bolsonaristas insatisfeitos. Entre os grupos identificados, destaco o Resistência Sulista, ligadas ao fascista russo Aleksandr Dugin.
Já havia mencionado antes como duginistas e outros neofascistas vinham atacando o voto da população, agora as investigações revelaram que eles também têm instruído como produzir armas ilegais com impressoras 3D.
Mas o que é a Resistência Sulista identificada pela ABIN? Originalmente era um setor regional da Nova Resistência, especializada em modular o discurso da organização para os anseios da extrema direita do Sul do país, como a pauta do separatismo e o europeísmo branco.
Em primeiro é preciso esclarecer que o fascismo é um projeto parasitário, ele não possui corpo próprio, busca infiltrar e usar uma carapaça já existente para inserir um projeto imperial, medievalista e altamente reacionário de capitalismo, em oposição ao capitalismo de corte liberal
No atual estágio da nova-“nova direita”, os sinais de absorção dos náufragos do bolsonarismo é claro, já expliquei anteriormente, e recordo o papel da Nova Resistência na aliança e campanha dos candidatos do União Brasil na última eleição. Lembre disso e voltemos um pouco.
Inicialmente a Nova Resistência, sucursal do grupo norteamericano New Resistance, lançou um manifesto de projeto separatista focado no Sul do país. A primeira carapaça pra ocultar sua natureza política ainda era bem explícita, exaltavam um nacionalismo de Enéas Carneiro. Como a liderança era do Rio de Jaeiro, logo segmentações organizativas da NR se tornaram necessárias. Daí surge a Nova Resistência Sulista, operada por Carlos Henrique Guntzel. Criando várias cabeças no mesmo corpo, a hidra causava ilusão de volume. Nos 2010, realizaram eventos como se fossem 2 organizações.
Destaco aqui o Fórum das Resistências, e os dois Cafés Dissidentes. Neste pequeno grupo encontramos gente por exemplo como Douglas Torraca e JP Henz, este último bem ativo no Twitter atualmente como warmonger para o público conservador de direita e até de esquerda.
O motivo do líder da Nova Resistência, Raphael “Alberiq” Machado, fingir agora desconhecer a Resistência Sulista se deve a vários fatores, um deles é a relação com os mais virulentos hitleristas q já agiram em prol de sua organização. Vejamos alguns personagens.
André Marques, fundador do antigo portal neonazista O Sentinela e da editora que publicava livremente obras clássicas do nazismo, como o próprio Hitler e o manifesto do atirador do massacre de Christchurch, é um amigo pessoal de Machado. Ele é um dos mais empenhados ativistas do neonazismo.
Apesar da estratégia “kamarad de Schrödinger”, onde um personagem é ou não filiado de acordo com o nível de implicação criminal do momento, é fácil comprovar a presença de Marques e outros do Sentinela nos eventos da Resistência Sulista. Aqui em trechos de uma entrevista para um podcast neofascista:
NS se refere a Nacional-Socialismo, Nazismo. “Moedinha” é um termo racista contra judeus. Em Novembro de 2023, durante a operação de combate a células neonazistas de cunho terrorista, a fase 3 da operação Accelerare prendeu André Marques e outras lideranças de organizações no país.
Os casos de Schrödinger são vários ao longo da história. Vão desde o “apagamento” do pianista Newton conectado a rede neofascista transnacional, flagrado aqui num ponto de encontro neonazista do sul do país com personagens internacionais, até o infame Álvaro Hauschild, aqui planejando estratégia de propaganda com Douglas da Resistência Sulista e Raphael Machado.
Mais à frente explico os motivos da ruptura por divergências estratégicas em organizações distintas, mas vamos falar sobre um ponto de acordo neste período Nova Resistência/Resistência Sulista: a formação de mílicias paramilitares e golpistas. Como se sabe Dugin defende a estratégia dupla do caos social somado a infiltração nos organismos legais da sociedade. A presença de propaganda da Resistência Sulista em canais neonazistas aceleracionistas sugere a relação com a organização. Observe o perfil de um membro da Misanthropic Division Brasil, grupo de orientação terrorista e neonazista para atuar em consonância e até diretamente na guerra da Ucrânia, arregimentada por um italiano da Casapound por aqui.
Vemos a presença do mesmo material de memeficação de guerrilha cultural neofascista adotada pela Nova Resistência também, como por exemplo o slogan com fuzil “Defenda”. Muitos cartazes compartilham do mesmo arquivo modelo, mudando apenas a logo da organização em questão, mas mantendo grafismos e fontes.
A ABIN descobriu q além de espalhar fake news sobre a justiça eleitoral e as urnas, os grupos neonazistas estavam tentando capturar público novo. A Nova Resistência, ao contrário, subia à superfície, estava diretamente no ambiente dos golpistas. Aqui Ricardo Xérem no acampamento na CML (Comando Militar do Leste), Rio de Janeiro. Xérem, membro da Nova Resistência, ficou famoso em uma foto com Rui Costa do PCO (Partido da Causa Operária), junto do violento integralista e ex-bolsonarista Angelo Castilho, também da Nova Resistência. Na campanha dos candidatos da União Brasil, ele também aparece e especula-se que tenha sido a ponte da Nova Resistência para a aliança.
É essa falta de capacidade inserção social de superfície da Resistência Sulista que distingue a rachadura entre Nova Resistência e Resistência Sulista. Na antiga estratégia da NR-Resistência Sulista, eles não ganhavam tração social e logo descobriram q a carapaça getulista poderia ser enviesada em direção a narrativas fascistas pois neonazis da América Latina já haviam feito malabarismo semelhante com Perón e outros, com grande sucesso de infiltração no tecido social. O problema é que os separatistas do Sul têm horror a figura de Getúlio Vargas, assim como diversos dos membros separatistas de São Paulo que compunham a organização.
Por volta de 2019 já era presente uma pressão silenciosa. Raphael Machado, o Alberiq, passou a buscar uma maior centralização do poder removendo as autonomias desses setores. Os próprios membros do agora Sol da Pátria, do chamado “politburo”, já indicavam discussões por fora.
Com a mudança estratégica de deixar o separatismo de cunho racial-regional oculto, para uma segunda etapa, num futuro impreciso, em favor de uma carapaça trabalhista”/”getulista” de sucesso, a Resistência Sulista rompeu com a Nova Resistência, sem no entanto tentar minar a NR-matriz como sendo uma rival. Anos depois, o “politburo”, formado por neofascistas agitadores do campo olavista dos 2000, viram com a guerra da Rússia o mesmo destino de perda de vetor social e risco no plano cada vez menos dissimulado, traçado pelo verdadeiro líder da organização, o russo Aleksandr Dugin.
Assim Sol da Pátria trocou a imagem do esotérico da Rússia, Dugin, pelo astrólogo da Virgínia, Olavo de Carvalho, e a roupagem nazistóide do tradicionalismo de Evola pela roupagem ambígua do tradicionalismo reacionário de Guenón, e buscaram se aliar ao MBL via um novo “nacionalismo trabalhista” supostamente ex-bolsonarista.