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A experiência bolsolavista ensina que a extrema direita, no seu desespero por aparências, ora se agarra a simplicidade caricata, ora a pseudo-sofisticação ininteligível, saltando de uma pra outra sem pudor. Falo agora sobre as reviravoltas das fontes pela 1TP, que não acabou +
No séc 19 os povos da Europa, seduzidos pela flauta burguesa, entraram em um processo ressentido de busca por um identitarismo mágico. As elites alemãs, seja a falida do império medieval quanto a nova capitalista, em seu ócio criativo gestou uma discussão nacionalista estética +
Acreditavam que a tipográfica dos livros deveria ser distinguida entra a nacional, grandiosa, germânica, e a latina, medíocre, estrangeira. A primeira representada pelo Fraktur, cheia de floreios, a mais famosa fonte gótica, e a segunda, Antiqua, simples e acessível. +
O príncipe de Bismarck chegava a rejeitar livros alemães escritos na fonte "latina", mas não só os reacionários do império, a outra direita, a burguesia romântica, os hippies de então, também gastavam suas tardes lutando pela floreada letra gótica. +
Mais tarde, parte do nazismo defende a fonte gótica. Em suas invasões imperiais descobrem que 1) a prensa do resto do mundo não se adequa a fonte 2) ninguém consegue ler decretos e propaganda nessa letra aristocrática fora da germânia. A solução é, a de sempre: falsificação. +
Em nota de 1941, decretavam o banimento da fonte Fraktur, "é falso considerar a assim chamada fonte gótica como uma fonte germânica…[ela] consiste de letras Schwabacher judias". Em Fraktur, anunciava, "Hoje o füher decreta que a fonte Antiqua deve ser a fonte padrão". +
Tipógrafos como Paul Renner, que desenvolveu a fonte modernista mais famosa do mundo, a Futura, antes perseguido por anti-nacionalismo, "Bolchevismo Cultural", agora tinha sua obra absorvida como símbolo de germanicidade nas viradas erráticas do governo nazista. +
Inversamente análoga, a 2ª onda futurista na Itália fascista, no que hoje seria o parasitismo hipster, sub-celebridades exóticas lutavam por uma boquinha no governo se dobrando em favor do status quo e da manutenção, mas falando de ruptura e dissidência para os ingênuos. +
Fortunato Depero, um dos futuristas fundadores da tipografia do fascismo italiano, ao perceber o fim do movimento fascista, queimou o máximo de obras que pudesse lhe comprometer com o ideologia e migrou para os EUA, onde serviu a high society burguesa, livre do seu passado. +
Anos depois, a discussão renasce na nova extrema direita dos anos 60. Com a agitação cultural da "new left" pelo mundo, a direita francesa tenta criar sua "nova direita" cultural. Do mesmo bueiro de onde sai Alain de Benoist e o grupo GRECE, emerge o grupo Occident. +
Imitando o estilo hippie, tomam uma letra de feição modernista, anti-gótica. A mimetização fracassa nessa 1ª alt-right, mas anos depois grupos em torno de Le Pen reabsorvem a fonte, agora mais toscas, ganhando o nome de Rata Negra, referência ao mascote do neofascismo francês. +
Outro salto de tempo, agora a Rata Negra se refina com influência das fontes modernistas futuristas absorvidas durante o fascismo italiano. Surge a Ultras, se firmando como a caligrafia mais evidente do neonazismo entrista contemporâneo em todo mundo, inclusive no Brasil. +
A estética nos ensina que a extrema-direita é mimetizadora, ela se fantasia. Para entender sua intenção e destino é preciso observar para fora da sua aparência, que se transforma de acordo com a conveniência.